2022-11-21

Defendemos a Soberania Alimentar e os nossos territórios, contra a violência, os despejos e o agronegócio!

(Bagnolet, 15 de novembro de 2022)

Neste 25 de novembro de 2022, Dia Internacional pela Eliminação da Violência contra a Mulher, como camponesas, organizadas na Via Campesina, exigimos a Soberania Alimentar, o direito à terra, o fim da criminalização e todo tipo de violência no campo e nas cidades. Ao mesmo tempo, denunciamos que em tempos de crise alimentar, política e económica os números da violência contra mulheres, crianças e outras diversidades são alarmantes, pelo que é urgente construir sociedades livres de violência, comunidades de paz com justiça social.

Soma-se à situação de violência estrutural que as mulheres vivenciam no mundo o alto custo de vida, as consequências do COVID 19, o trabalho de cuidado de idosos e crianças por falta de infraestrutura estatal, falta de emprego, deslocações e migrações forçadas, guerras e desastres climáticos.

Hoje mais do que nunca devemos consolidar a Soberania Alimentar como espaços de vida nos territórios, e como caminho concreto contra as políticas capitalistas e coloniais que oprimem e violentam as mulheres e mercantilizam a vida. Em todo o mundo, estima-se que 2 em cada 3 mulheres foram abusadas durante a vida. No campo, a violência é aprofundada pela expansão do agronegócio, actividades extrativistas e roubo de terras, além da falta de políticas de apoio ao campesinato e, principalmente, às mulheres. Os principais recursos económicos são destinados a grandes investimentos agrícolas no sector hidroagrícola e mineração. Enquanto despejos violentos, feminicídios e criminalização continuam com total impunidade em cumplicidade com os Estados e a Justiça.

Ao longo desses 30 anos, as propostas políticas da Via Campesina continuam válidas e mais actuais do que nunca, e os camponeses têm um papel fundamental na Soberania Alimentar, na conservação da biodiversidade e na produção de alimentos saudáveis ​​com práticas agroecológicas, nos mercados, na economia familiar e na vida política e organizacional. No entanto, as mulheres camponesas, indígenas, sem-terra, pescadoras e pastoras continuam a reivindicar igualdade estrutural, trabalho remunerado e digno no campo, que seja reconhecido o trabalho de cuidado, que seja garantida a participação política, o acesso à terra, o direito a serviços básicos e investimento na agricultura camponesa, conforme reconhecido pela Declaração dos Direitos dos Camponeses aprovada pela ONU em 2018.

Artigo 4: Não discriminação contra as mulheres

  1. Os Estados devem tomar todas as medidas apropriadas para erradicar todas as formas de discriminação contra as mulheres camponesas e outras mulheres que trabalham em áreas rurais e promover a sua afirmação para que possam desfrutar plenamente, em pé de igualdade com os homens, de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais e trabalhar pelo desenvolvimento económico, social, político e cultural do meio rural, dele participar e dele usufruir com total liberdade.

Vamos defender nossos territórios do agronegócio e dos feminicídios!

Não podemos permitir que o agronegócio e o feminicídio avancem nos nossos territórios.

Os feminicídios são hoje a expressão mais violenta contra os corpos das mulheres, e os números crescem em todo o mundo.

Na Europa, a ascensão da extrema-direita está a provocar o aumento dos casos de feminicídio, como em Itália que aumentou 15% ou em França em que são registrados a cada 48 horas, e em Espanha 76 feminicídios e outros assassinatos de mulheres foram registrados até agora, em 2022.

A violência contra mulheres e crianças também é alta em África, particularmente em zonas de conflito, como na República Democrática do Congo. Em África do Sul, de abril a junho de 2022, foram notificados mais de 9.500 violações, quase 4.000 desses ocorreram dentro de residências.

Actualmente, a América é um dos continentes mais violentos para as mulheres, a maioria dos assassinatos ocorre no ambiente familiar, bem como pelo crime comum e organizado. Por exemplo, no Equador, a cada 31 horas é registado um feminicídio. Enquanto no Brasil a cada 7 horas e uma violação a cada dez minutos.

Da mesma forma, no Sudeste Asiático, 33% das mulheres com parceiros de 15 a 49 anos sofrerão violência física e/ou sexual por parte de um marido ou parceiro actual ou anterior pelo menos uma vez na vida.

Nesse sentido, como La Vía Campesina exortamos os Estados a investirem em políticas públicas de prevenção e resposta à violência de género, exigimos mecanismos para que os órgãos de justiça sejam sensibilizados sobre questões de gênero, para que tenham empatia e respeito no tratamento dos casos, bem como condições políticas e económicas estabelecidas pelo Estado que garantam peritos suficientes e que seja respeitada a dignidade dos sobreviventes.

Mulheres em todo o mundo exigem saúde pública integral e que seus direitos humanos sejam garantidos. Instrumentos como o código roxo, cujo objetivo é proteger e dar atenção prioritária às mulheres vítimas de violência de género, têm se mostrado ineficazes, as sobreviventes são revitimizadas por meio de longos e tediosos processos de denúncia, razão pela qual muitas mulheres desistem das denúncias. Em vários países e culturas, as meninas continuam a ser forçadas a casar e dar à luz, enquanto milhões de mulheres morrem em abortos clandestinos, sem garantia de seus direitos sexuais e reprodutivos, como o acesso à menstruação decente.

É por isso que como Via Campesina, no dia 25 de novembro levantamos a nossa voz pela memória e justiça para todas as mulheres que lutam, defensoras dos territórios e sobreviventes da violência. Solidarizamo-nos com as famílias e organizações e expressamos a nossa preocupação com todos os defensores, mulheres, jovens e diversidades que sofrem assédio, violência e represálias do Estado, das empresas transnacionais e da Justiça pela resistência activa contra o agronegócio.

Neste dia de acção, junto com mulheres organizadas de todo o mundo, convocaremos marchas, fóruns, acções directas em tribunais, feiras e outros eventos denunciando a violência quotidiana e estrutural vividas.