2020-10-16

Só com a Agricultura Familiar podemos ter Soberania Alimentar em Portugal

 

Manifestação de Delegações de Agricultores e Dirigentes Associativos

 16 de Outubro | Assembleia da República | Lisboa

 

Hoje, 16 de Outubro, Dia Mundial da Alimentação, Delegações de Agricultores e Dirigentes Associativos, com a CNA e Filiadas, estão em Lisboa para afirmar que a Agricultura Familiar, que produz alimentos saudáveis e sustentáveis do ponto de vista ambiental, social e económico, e abastece o País e os mercados de proximidade, não pode continuar a ser esquecida. Ignorar a importância estratégica da Agricultura Familiar é um erro crasso que compromete a Soberania Alimentar e o desenvolvimento do País.

Lamentavelmente, as más políticas nacionais e outras emanadas de Bruxelas, nomeadamente através da Política Agrícola Comum (PAC), continuam a forçar o encerramento de explorações agrícolas a um ritmo assustador. Desde que Portugal entrou na então CEE, a cada hora que passa encerram 1,33 explorações (dados INE), principalmente da Agricultura Familiar, e as que resistem enfrentam agora mais dificuldades de escoamento devido à pandemia de COVID-19. Os preços na produção permanecem em baixa acentuada, sem qualquer reflexo nos preços no consumidor, situação agravada pela “ditadura” comercial da grande distribuição a que é preciso pôr fim!

O Governo e o Ministério da Agricultura têm de tomar medidas urgentes! A CNA e Filiadas consideram absolutamente fundamental que se avance decididamente com a implementação das importantes medidas preconizadas pelo Estatuto da Agricultura Familiar aprovado há mais de dois anos. É preocupante, e mau para o País, que o Governo ignore este Estatuto nas propostas elaboradas, até ao momento, para o Plano Estratégico da PAC ou para o Plano de Recuperação Económica e que a proposta do Orçamento do Estado (OE) para 2021 não contemple as verbas necessárias para a sua concretização.

A CNA considera prioritário que, de entre outras medidas, se contemplem no OE para 2021 os apoios adicionais à utilização do gasóleo e da electricidade verde, um regime fiscal adequado à Agricultura Familiar, o estabelecimento da preferência obrigatória por produtos alimentares de origem local no fornecimento de cantinas e refeitórios de entidades públicas e apoios públicos aos mercado locais de maior proximidade entre produção e consumo.

É também necessário que o Estatuto da Agricultura Familiar reconheça o importante papel das mulheres agricultoras, nomeadamente, através de um regime de contribuições para a Segurança Social que lhes permita ter uma vida digna e uma justa protecção social.

A Agricultura Familiar vive também uma situação dramática com os prejuízos diários causados pelos javalis e outros animais selvagens, o que está a levar muitos pequenos e médios agricultores a não semear para não acumular mais prejuízos. Tudo isto acontece perante a passividade do Governo, que se desresponsabiliza desta grave situação. É urgente um controlo eficaz do número destes animais e o pagamento pelo Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) dos prejuízos sofridos pelos agricultores.

Mantêm-se também sem concretização prática as compensações aos agricultores com avultados prejuízos causados por incêndios florestais / rurais ou por acontecimentos climáticos extremos, como, por exemplo, o furacão Leslie de Outubro de 2018 ou as intempéries que devastaram vastas áreas de pomares e vinhas na Primavera / Verão de 2020.

No contexto da Política Agrícola Comum, a CNA defende que as políticas se devem basear nos princípios da Soberania Alimentar, permitindo e fomentando a produção de alimentos seguros e saudáveis em cada Estado-Membro, com respeito pelos seus agricultores, as suas especificidades, tradições e dieta alimentar.

É urgente inverter o rumo tomado na agricultura nacional e europeia, que previlegia as grandes e muito grandes explorações agrícolas como fonte fundamental de fornecimento de alimentos industrializados à população. Inverter esse rumo começa, desde logo, por uma melhor distribuição das ajudas, com prioridade à Agricultura Familiar e à Floresta multifuncional e de uso múltiplo, e pela sua atribuição apenas para quem produz e por uma forte modulação (redução progressiva) e plafonamento (limites máximos).

A CNA entende que não são aceitáveis mais cortes no orçamento da Política Agrícola Comum, sendo de salientar neste contexto que o rendimento médio dos agricultores portugueses é de cerca de 50% do rendimento médio dos demais cidadãos, e isto já considerando as ajudas da PAC.

Ainda no contexto das ajudas, a CNA defende que o RPA – Regime da Pequena Agricultura possa ser valorizado, atingindo os 1250€/ano já em 2021.

Outro aspecto que causa preocupação é o facto de Portugal ter os agricultores mais velhos da Europa. O rejuvenescimento da Agricultura é urgente, sendo necessário criar condições para a fixação dos filhos dos agricultores familiares nos territórios rurais e para que os jovens agricultores se mantenham em actividade após os 5 anos obrigatórios dos projectos de instalação. Revitalizar o Mundo Rural passa também pela (re)abertura de serviços públicos de qualidade e de proximidade, como centros de saúde, escolas ou postos de correio.

É necessário que as medidas de apoio ao investimento que pretendem valorizar a Floresta, a paisagem e o ambiente sejam adequadas aos pequenos e médios produtores e proprietários florestais e que impeçam o assalto à propriedade privada da Agricultura Familiar (e também aos baldios) para fundos de investimento ou para grandes empresas.

A gestão activa da Floresta, e mesmo a prevenção dos incêndios florestais, passa também pelo fim dos preços baixos na produção da madeira, impostos pela grande indústria da fileira florestal.

A Agricultura Familiar tem um papel fundamental no aumento da produção alimentar nacional, na qualidade e saúde alimentar, na coesão económica, social e territorial, contribuindo ainda para o arrefecimento do planeta.

Mas só é possível colher os benefícios ambientais, sociais e económicos da Agricultura Familiar, da pequena e média agricultura, apoiando a produção e o rendimento dos pequenos e médios agricultores, com outras e melhores políticas agro-rurais.

É por isso que a CNA e Filiadas, sempre com os Agricultores, estão hoje em Lisboa a reclamar aos Órgãos de Soberania que coloquem a Agricultura Familiar no centro da Política Agrícola!

 

Coimbra, 16 de Outubro de 2020

A Direcção da CNA

 

COMUNICADO